O livro escrito por Cristóvão Tezza, cruza romance com um testemunho auto-biográfico, de quem vê o seu projecto de vida embater na realidade de um filho atrasado. E se utilizo a palavra atrasado, não o faço de ânimo leve ou ofensivamente, mas porque é como o próprio autor o encara muitas vezes. Se quisermos ser honestos, é como uma grande parte de nós, ainda que sem necessariamente com uma malícia consciente, se refere por vezes às pessoas com síndrome de Down.
A escrita de Tezza transpira genuinidade, porque coloca em palavras os sentimentos e pensamentos politicamente incorrectos, e até mesmo cruéis, que alguém na sua posição normalmente sente mas não admite. Um filho que nunca será verdadeiramente autónomo, é um empecilho no dia-a-dia de qualquer pessoa. Torna-se mesmo o escape para a frustração que deriva da não concretização dos objectivos mais megalómanos de cada um; aqueles de que normalmente ficamos aquém de qualquer forma. Não é fácil evitar ter raiva, ou mesmo ódio, da criatura que nos prende a esse destino.
O livro é uma jornada por diversos estados de espírito. Uma esperança inicial de que foi um engano, porque afinal os erros acontecem. Negação do que essa realidade acarreta, e finalmente a resignação de que resta fazer o melhor que se consegue, durante uma vida inteira. Porque não haverá uma solução mágica; uma epifania digna de livros de auto-ajuda que nos revela como estamos perante uma bênção disfarçada. Não, é mesmo uma merda, e sempre será. Mas é também o nosso filho. E o caminho para conseguir estabelecer uma comunicação com alguém que tem um quadro mental tão diferente, e estabelecer afinidades, pode ser penoso.
A vergonha de partilhar e admitir publicamente essa parte da sua vida, bem como o desejo sempre presente de um filho normal, um pouco mais normal que fosse, perpassam a cada página do romance. A escrita de Tezza é crua, desviando-se desse registo apenas quando envereda por referências culturais (importantes na medida em que nos dá a conhecer o contexto do narrador e o profundo significado que este atribui às mesmas). Mas nada de excessos melodramáticos.
Apesar de muito bem escrito tecnicamente, não me identifiquei com a escrita do autor, o que se reflectiu numa falta de empatia, e a espaços levou mesmo a uma leitura maçadora. Mas vale bem a pena que se lhe dê uma hipótese, até porque é o tipo de obra cujo prazer da leitura está intimimamente ligado às particularidades da personalidade de cada um.
Classificação: 7/10
Título: O Filho Eterno
Autor: Cristóvão Tezza
Páginas: 238
Edição/reimpressão: 2008
Editor: Gradiva Publicações
Prémios: Prémio Jabuti 2008 / Prémio Portugal Telecom 2008
1 comentário:
Já li esse livro há muito tempo (quando ganhou o prémio PT) e gostei bastante e a semana passada comprei-o a €4.5!
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