O Senhor Linh, numa idade em que já pouco esperava da vida além de alguma serenidade e carinho, vê-se forçado a procurar refúgio em França. Para trás ficam a sua casa e aldeia, e o seu filho e nora, ambos mortos pela guerra. Para trás fica tudo aquilo que alguma vez conheceu. Ou quase tudo. Consigo viaja a sua neta, ainda apenas um bebé que depende de si para tudo, e que é a única razão porque encontra forças para continuar. Mas se nesse propósito encontra a força para enfrentar o dia seguinte, é numa improvável amizade que encontrará o alento para superar o desespero que este sempre traz. Para Linh e Barker, o homem de aspecto gentil que conheceu, uma só pessoa, e com a qual não partilham sequer um idioma comum, foi o bastante para fazer a diferença.
A escrita de Claudel é emocional sem incorrer em excessos melodramáticos, uma tentação muitas vezes presente neste tipo de narrativas. Mergulha-nos na realidade de um homem que cruza em si os dramas de um refugiado, e do estigma e condescendência que uma sociedade desenvolvida reserva aos que entraram no ocaso da vida. Coloca-nos no outro lado do espelho, em que vestimos a pele de um velho alienado que sente já não ter lugar no mundo, ou sequer conseguir comunicar com os seus habitantes. O que para nós é um facto óbvio, para alguém nas suas circunstâncias apresenta-se como um enigma cruel. E Claudel fá-lo através de uma estrutura narrativa que começa pelas páginas estritamente indispensáveis à contextualização da vida de Linh, dedicando-se então de forma mais demorada à exploração do nascimento e evolução de um vínculo de amizade entre dois homens magoados pela vida, enquanto acompanha paralelamente o dia-a-dia de Linh no centro de refugiados e o seu destino posterior, até culminar num clímax que nos conduz a uma percepção diferente da vida daquele ancião. Esta forma contida de contar a estória, acaba por amplificar o impacto das palavras do autor sobre amizade, solidão, mágoa e esperança. São cerca de 90 páginas que provam que os livros não devem ser avaliados pelo seu tamanho, e que conseguem provocar fortes sentimentos.
Philippe Claudel, para além de escritor premiado com prémios como o Goncourt e Renadout, é Mestre de Conferências da Universidade de Nancy, professor no Instituto Europeu de Cinema e Audiovisual, e desde 2008, também realizador, com o filme Il ya longtemps que je t’aime. É editado em Portugal pela ASA.
Classificação: 8/10
Título: A Neta do Senhor Linh
Autor: Philippe Claudel
Editor: Edições Asa
Edição/reimpressão: 2006
Páginas: 96
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